Quinta-feira, 8 de Novembro de 2007

Umberto Domenico Ferrari



É notória e notável a evolução que se observa na obra do mestre Vittorio de Sica, nos quatro anos que decorreram entre Ladri di Biciclette (1938) e Umberto D. (1942). Ambos partilham muito mais do que o senhor por detrás das câmaras – a selecção a dedo de actores amadores, a desconstrução da inexorável pobreza da classe trabalhadora da Itália do pós-guerra, o estilo enganadoramente simples de capturar todo este ambiente opressivo – ou não estivesse eu a falar de um dos principais magnum opus do neo-realismo Italiano e da obra que lhe colocou um fim, respectivamente.


Umberto D. é tão ou mais tocante do que Ladri di Biciclette: à trágica ironia infinitamente comovente do final deste responde com um brilhante e constantemente cativante estudo da vida de um velho (notável Carlo Battisti) que mais não queria do que uma vida descansada com o seu cão Flike e, por um motivo ou outro, nunca o conseguia. Entre um e outro, De Sica evoluiu claramente enquanto cineasta; o aspecto de ambos, dentro dos constrangimentos naturais do género, difere na medida em que Umberto D. acabou por resultar num filme menos amador e tecnicamente superior.


Em última análise, no entanto, o que fica para a História não são as tecnicalidades. Daqui a várias décadas, quando a esmagadora maioria dos filmes actuais tiverem sido condenados ao esquecimento, as obras de De Sica continuarão a ser recordadas como duas das mais imortais do Cinema.


Fábio Jesus às 20:24
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Domingo, 21 de Outubro de 2007

Quando tudo era tão mais simples...


Charles Chaplin em Modern Times (1936)


… e tão melhor.


Fábio Jesus às 23:41
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Sábado, 17 de Março de 2007

Nuovo Cinema Paradiso (1989), de Giuseppe Tornatore



Itália do pós-Segunda Guerra. Toto é um órfão de pai,  perdido  a lutar algures na Rússia. O seu único refúgio é o cinema  da pequena localidade onde vive – chamado Cinema Paradiso -, pelo qual nutre uma profunda admiração, e para o qual vai sempre que pode. É também aí que conhece Alfredo, o velho projeccionista, com quem desenvolve uma grande amizade, e que se torna o seu maior confessor e lhe ensina os segredos da projecção cinematográfica. Os anos passam e Toto cresce, apaixona-se e vai para a tropa. Eventualmente decide partir, procurar uma vida nova, e Alfredo fá-lo prometer que não voltará ou dará notícias. Mais de trinta anos depois, a notícia da morte de Alfredo leva-o a quebrar a promessa que havia mantido tão religiosamente, regressando à sua terra natal e reencontrando tudo aquilo que tinha tentado esquecer.


Desenganem-se aqueles que pensam que Nuovo Cinema Paradiso é um filme sobre cinema per se. A 7ª Arte é apenas o pano de fundo para esta fábula sobre amizade, paixão e nostalgia. O que não quer dizer que o cinema exista apenas no título, muito pelo contrário: o cenário do filme por excelência é a tal sala Cinema Paradiso, e as referências abundam: dos italianos Luchino Visconti e Michelangelo Antonioni aos mais geograficamente distantes Charlie Chaplin ou John Wayne , encontra-se um pouco de tudo – a própria sala de projecções contém numa das paredes um poster de Casablanca -, numa clara tentativa de homenagem (que culmina na famosa montagem final…) por parte de Tornatore. Em parte, o filme é uma celebração do cinema enquanto máquina de sonhos capaz de despoletar as mais extraordinárias reacções, enfeitiçando o espectador de uma maneira singular e inimitável. O fascínio inicial de Toto e um pouco de toda a população da pequena localidade em torno das projecções cinematográficas é prova disto mesmo, e aparece como uma espécie de carta de amor do realizador a uma época na qual este efeito não era ainda reduzido e condicionado pelo fenómeno cinema em casa – o seu objectivo, aliás, era mesmo que o filme servisse como uma espécie de obituário às casas de projecção tradicionais e à indústria de cinema em geral.


Mas o verdadeiro triunfo de Nuovo Cinema Paradiso reside na relação improvável entre o miúdo Toto e o projeccionista Alfredo (o recentemente falecido Philippe Noiret, numa interpretação notável). Embora inicialmente relutante, Alfredo acaba por ceder face à insistência e aos encantos do pequeno, ensinando-lhe a sua arte – segundo ele, tudo aquilo que sabe fazer – e tornando-se o seu melhor amigo. Desta amizade resultam algumas das melhores cenas de todo o filme, como aquela em que Toto salva Alfredo de morte certa quando este se confronta com um incêndio que reduz a cinzas a sala de cinema e leva à sua reconstrução e consequente renomeação para Nuovo Cinema Paradiso . Quando Toto se apaixona, é a Alfredo que pede conselhos e é com o velho que confidencia.


Contada em flashbacks, a história mostra-nos três fases da vida de Toto: a primeira, enquanto criança inocente e fascinada com o efeito hipnotizante do cinema; a segunda, na adolescência, que traz o primeiro amor e a responsabilidade de tomar conta do cinematógrafo; finalmente, trinta anos depois da fase anterior, a vida de adulto, que inicia e fecha o filme: Toto é um realizador famoso e respeitado, com uma vida nova que mantém da infância a paixão enorme pelo cinema. Tornatore filma toda esta sequencialização temporal sem uma ponta de pretensiosismo, com uma simplicidade contagiante. Não existem aqui planos complicados nem artifícios técnicos complexos, apenas a segurança de quem sabe que é possível, e quem sabe, mais fácil, fazer bom cinema sem cair no show-off desnecessário.


Visto por uns como clássico intemporal e por outros como uma obra demasiado sentimentalista que usa e abusa do schmaltz, Nuovo Cinema Paradiso é visualização obrigatória, quanto mais não seja pela simplicidade desarmante com que conta uma história que, não sendo original ou inovadora, cumpre na sua totalidade o seu propósito, e não cessa de encantar.


9/10


Fábio Jesus às 18:48
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